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TI e o Setor de Seguros

23.11.06
Continuação de "Barrando o Crescimento"

Foto de SWRuler

O vovô do InsHub nasceu mais ou menos na mesma época que o Nicholas Carr alcançou seus 15 minutos de fama, com o artigo "IT Doesn't Matter". Na época nós só falamos o seguinte: "Vamos perdoá-lo. Ele não sabe como é TI no mercado de seguros brasileiro". Na verdade a questão é bem mais abrangente, mas não é o que queremos discutir aqui. O fato é que olhando aqueles 'contos da cripta' do artigo anterior, todos baseados em histórias reais, concluímos que TI importa muito para o mercado de seguros. Pior: TI hoje pode ser um 'freio' para a aguardada expansão do setor.

Chega a ser curioso, porque o setor de seguros foi um dos primeiros a aproveitar o potencial dos computadores, nos longínquos anos 60. Depois, particularmente nos últimos anos, passou a se caracterizar como um setor muito conservador quando o assunto é tecnologia. No Brasil, confrontadas com o aparente dinamismo dos co-irmãos Bancos, as seguradoras tentam desenhar um novo perfil. Neste ponto cabe uma avaliação mais ampla. Sobre estratégias e o perfil do Capital da Informação das seguradoras.

De uma forma bem simples, podemos dizer que todo negócio se encaixa em uma de quatro grandes proposições de valor: i) Baixo Custo; ii) Inovação; iii) Soluções Completas; e, iv) Aprisionamento. O humor do mercado e a saúde da empresa pode forçá-la a alterar sua principal proposição de valor. Mas, no geral, normalmente ela segue sendo percebida pela proposição que a caracterizou inicialmente. Por isso é fácil associar a Gol Linhas Aéreas, Casas Bahia e McDonalds no primeiro grupo. Apple, Sony e Intel entram no pequeno pelotão de Inovadores. IBM, Bradesco e Itaú entram no terceiro grupo. E estratégias de aprisionamento caracterizam empresas como Microsoft, Visa, HP e Gillette.

Quando TI está alinhada ao negócio, ela respeita a sua grande estratégia, sua Proposição de Valor. O quadro abaixo apresenta o Perfil do Capital da Informação de cada grupo listado no parágrafo anterior. É importante entender que o Perfil mostra onde vão (ou deveriam ir) os principais investimentos em TI.


Assim, de uma maneira um tanto simplista (e simplificada - ou vice-versa), tentamos mostrar que as Seguradoras sofrem com uma certa 'falta de personalidade'. Mesmo que seja fácil qualificar algumas como empresas que se caracterizam pelo Baixo Custo ou por oferecerem Soluções Completas, o fato é que é relativamente complicado definir o perfil do Capital da Informação de uma seguradora. Na verdade, em nossa opinião, as seguradoras mais famosas (e bem sucedidas) se caracterizam exatamente por se equilibrarem nas 4 proposições de valor apresentadas. Se por um lado podemos elogiar sua flexibilidade, por outro podemos dizer que seus investimentos vivem pulverizados em diversas iniciativas e projetos. No final das contas, "tudo é estratégico". Deveria ser?

Robert Kaplan e David Norton classificam o Capital da Informação em 4 grandes grupos [1]: a) Infra-Estrutura; b) Aplicações Transacionais; c) Aplicações Analíticas; e, d) Aplicações Transformacionais. Estudos da dupla e também do MIT tentam mostrar o destino dos orçamentos e investimentos de TI nesses 4 grupos, dependendo da Estratégia, da proposição de valor de determinada empresa ou setor. Em um "Mix Típico", 58% do orçamento de TI vai para infra-estrutura, 12% em aplicações transacionais, 16% em aplicações analíticas e 14% em aplicações transformacionais (ou estratégicas). Nossos estudos em algumas empresas mostram que o 'mix' das Seguradoras é muito parecido com esse. Mesmo quando elas tercerizam parte de suas operações. Os números das aplicações (12%, 16% e 14%) comprovam o que chamamos acima de pulverização. Apenas para fins de comparações, em empresas com foco no 'Baixo Custo', as aplicações transacionais consomem aproximadamente 40% do orçamento.

Correndo o risco de oferecer 'contas de padaria', vamos brincar um pouco mais com os números antes de apresentarmos nossa 'tese'. No artigo anterior falamos que o orçamento geral de TI do setor de seguros gira em torno de R$ 4,2 bilhões por ano- 7% do faturamento total do setor. Este percentual é considerado a média do mercado de serviços financeiros. Desconfiamos que no setor de seguros o número é menor, em torno de 5%. Mas ficaremos com os números 'oficiais'. Analisemos o quadro abaixo:


Lembram-se dos 'Contos da Cripta' que apresentamos no artigo anterior? Todos eles estão relacionados com as Aplicações Transacionais, justamente a categoria que tem merecido a menor parcela do orçamento de TI por parte das seguradoras. Mas existem boas justificativas para tal. Nos últimos tempos, a pressão por um melhor gerenciamento de riscos e o combate a fraudes fez com que uma fatia considerável do orçamento de TI fosse direcionado para o que chamamos de Aplicações Analíticas (BI, datawarehousing e afins). Para fins de esclarecimento, consideramos que novas aplicações direcionadas para novos produtos e serviços (rastreamento, afinidade etc) se encaixam na categoria das Aplicações Transformacionais. De qualquer forma, sabemos que nossa 'conta de padaria' pode suscitar algumas discussões. Mas acreditamos que nenhuma invalidará nossa tese. Mas, afinal, qual é a tal 'tese'?

O próximo artigo tentará explicá-la.


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  1. Mapas Estratégicos - Convertendo Ativos Intangíveis em Resultados Tangíveis
    Robert S. Kaplan e David P. Norton. Elsevier / Editora Campus - 2004.



Barrando o Crescimento


Continuação da "Breve Análise do Mercado de Seguros"

Foto de Johann Rela

Além de todos os fatores apresentados no artigo anterior - todos eles dependentes de forças externas, o ecossistema que forma o setor de seguros no Brasil convive com uma série de barreiras que podem afetar negativamente seu potencial de crescimento. Os mais notáveis, no nosso ponto de vista, estão relacionados com os Padrões, Processos e Sistemas que suportam suas operações.

Nossos padrões favorecem (ou tentam privilegiar) o controle em detrimento da agilidade. Geram burocracia e uma contra-partida muito pobre. Ainda não há no mercado de seguros algo parecido com o SPB (Serviço de Pagamentos Brasileiro). A pressão por governança e um gerenciamento de riscos mais efetivo deve mudar essa situação. Falava-se que a FENASEG lançaria uma clearing já em 2007, que atuaria exclusivamente na regulação de sinistros. O fato é que as iniciativas parecem desaclopadas. E pouco discutidas. Não sabemos, por exemplo, as razões pelas quais a adoção do padrão ACORD não é sequer debatida no Brasil. No último mês de outubro aconteceu o II Insurance IT Meeting, no Rio de Janeiro. O principal tema do encontro foi a Padronização de Processos. É um passo.

Mas a questão que mais nos preocupa e que de certa forma deu origem ao Projeto InsHub diz respeito aos Sistemas. Na seqüência deste trabalho apresentaremos o projeto de forma detalhada. Mas cabe aqui ressaltar que o InsHub pode ser uma resposta tanto para os problemas enfrentados por uma seguradora quanto para um grupo de seguradoras e corretoras. Eventualmente, para todo o ecossistema. Soa ambicioso mas esperamos que no decorrer do documento nossa 'grande dúvida' fique bem explicada.

Mas, afinal, quais são os problemas com os sistemas?


Contos da Cripta

Para ilustrar bem alguns dos principais problemas vamos contar duas pequenas histórias. De terror:

Era uma vez uma média-grande seguradora. O ciclo de vida de seus produtos, assim como de todas as suas co-irmãs, é de 30 dias. Ou seja, a cada mês há um ciclo de atualização de praticamente todos os itens de sua carteira de produtos. A área de negócios - os designers dos produtos - tem até o oitavo dia para definir todas as alterações necessárias. Seu trabalho é baseado em estatísticas duramente arrancadas de alguns pobres-caros sistemas de Inteligência Corporativa (ou BI - Business Intelligence), além dos requisitos que chegam do mercado e através do órgão regulador. As alterações são passadas para a área de TI em formulários que lembram 'ordens de serviço' mal estruturadas. TI tem até o dia 15 para entregar TODAS as alterações. Sabe aquele filme, "O Dia dos Mortos-Vivos"? A coisa é parecida. Em algumas seguradoras existem mais de 15 sistemas a serem alterados! O módulo de emissão de apólices, o programinha utilizado pelo 'telemarketing', os 'kits de cálculo' que são enviados para corretores, o portal da web, DLL's que são enviadas para parceiros, etc etc. Por algum motivo que todo mundo sabe mas ninguém explica, cada programinha está codificado numa linguagem diferente. Tem COBOL, VB, Java, PHP, ASP, C#, Clipper (clipper?!?!) ETC etc.

As duas áreas se unem para testar TUDO até o dia 22. Sabe aquele "A Noite dos Mortos-Vivos"? Quase igual, até porque ninguém tem hora para ir embora nessa fase. E tem gente que acha que só controlador de vôo sofre muito para trabalhar. O fato é que entre o dia 22 e o final do mês TUDO tem que estar pronto para entrar no ar. Os 'kits' são distribuídos via CD ou pela web. O resto normalmente vai no dedo mesmo. Apesar dos corretores estarem cada vez mais simpáticos aos canais on-line, as seguradoras seguem lidando com uma multidão de mortos-vivos.

Agora o outro lado da moeda (do mal):

Era uma vez uma pequena-média corretora de seguros. Tem 19 funcionários, sendo 15 corretores, uma secretária, uma governanta (aquela do cafezinho), um estagiário (aquele) e um boy. Cada corretor tem seu micro e eles ficam o dia todo conectados. Os cinco corretores 'sênior' utilizam laptops de última geração. Os outros ralam com desktops de quatro anos de idade (no mínimo). Alguns rodam Windows 98, outros tentam rodar Windows XP. Um deles ouviu falar em Linux. É começo de mês. Um daqueles monstrinhos que nasceu na história anterior chegou via correio. O chefão pega o envelope, lê a revistinha e passa o CD para o estagiário: "Instale em todas as máquinas". Era para ser algo trivial se a corretora não trabalhasse com outras 10 seguradoras! São 10 CDs todo mês! 10 monstrinhos que vivem brigando com o Windows 98, com o XP e principalmente entre si. Departamento de suporte daquela empresa da história anterior: "Ah, eles atualizaram a DLL 'accesseverynothing'. Assim nosso kit não pode funcionar mesmo! Faz o seguinte, desinstala o deles e instala o nosso de novo..."

Em nenhum outro lugar o termo "DLL Hell" faz tanto sentido. Mesmo quando os 'kits' são baixados via Internet. Não faz diferença. Por isso (e pelas compensações financeiras), alguns corretores passaram a privilegiar os canais on-line. Aí o problema muda de cara e nome: passa a ser "Escalabilidade".

No Brasil existem cerca de 72.400 corretores ativos. Contando seus funcionários e adicionando os outros parceiros das seguradoras (normalmente bancos, concessionárias de veículos, lojas de departamentos, oficinas, prestadores de serviços, a turma da 'vistoria' etc), podemos estar falando de um universo de quase 500 mil usuários! Lógico, cada seguradora lida com uma pequena fatia dessa população. Ainda assim, é número que deixa qualquer 'portal' com o reset na mão. Mas há também o outro lado da moeda (que não escala).

Nosso corretor-herói, como falamos acima, trabalha com 10 seguradoras. Quando ele ou seu cliente está com muita pressa, ele faz a cotação em 3 seguradoras. Ou seja, digita 3 vezes praticamente as mesmas informações. Nos 'kits de cálculo' off-line ou em sites. São interfaces, conceitos e termos que mudam. Mesmo que se proponham a executar a mesmíssima tarefa: uma cotação. Um minúsculo universo daqueles 70 e tantos mil corretores tentou contornar esse cúmulo do desperdício com interfaces multi-cálculo. Todos com procedimentos e resultados um tanto questionáveis. Afinal, como integrar aquilo que muitas vezes não é integrado nem mesmo em uma única seguradora?


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Alguns dados relevantes:
  • O mercado de seguros deve fechar o ano de 2006 movimentando mais de R$ 60 bilhões em prêmios líquidos emitidos.
  • São aproximadamente 110 seguradoras, sendo que as 5 maiores são responsáveis por 60% do faturamento do setor.
  • Os 72.400 corretores devem repartir quase R$ 10 bilhões em comissões.
  • SE as seguradoras seguirem o padrão observado em outras instituições financeiras, o investimento do setor de seguros em TI é de aproximadamente R$ 4,2 bilhões.



Breve Análise do Mercado de Seguros


Considerações Iniciais

A análise apresentada neste artigo é fruto de pesquisas realizadas por 'leigos'. Apesar de convivermos com a área de seguros há mais de 5 anos, não podemos ser considerados especialistas. Os fatos aqui apresentados foram coletados em diversas fontes, todas elas listadas na seção 'Referências' ao lado.

Este artigo inaugural do blog do projeto InsHub tem o objetivo de justificar o projeto que será aqui apresentado e discutido. Trata-se de um Business Case. Mas não espere a formatação tradicional que um documento deste tipo costuma apresentar. Não aqui no blog. Oportunamente disponibilizaremos na seção de downloads toda a documentação formal do projeto. No momento o que nos interessa é a divulgação do InsHub; o estudo de sua viabilidade e, se estivermos corretos, a sua viabilização propriamente dita.

Foto de Andrew e Wendy Mc

Destinado a Crescer

Poucos setores da economia apresentam tanto potencial de crescimento quanto o mercado de seguros. Um potencial que já é parcialmente realizado nos últimos tempos. Se compararmos os três primeiros trimestres de 2006 com igual período de 2005, por exemplo, veremos um crescimento de 13,13%. Se excluirmos os mercados de Capitalização e Previdência Privada, veremos que o mercado de Seguros apresentou uma expansão de 17,82%. Enquanto isso o PIB engatinhou em torno dos 2,2% no primeiro semestre. Dentre os fatores que contribuíram para a expansão do mercado estão o lançamento de produtos 'populares' e o jogo mais agressivo que alguns players, particularmente os bancos, adotaram nos últimos tempos. Porém, ainda assim, o mercado de seguros deve seguir representando menos de 4% do nosso Produto Interno Bruto. Para se ter um idéia, nos EUA ele representa 10%. No Japão, 12%. Por isso muitos acreditam que nosso mercado de seguros pode dobrar de tamanho em um horizonte de 3 anos. Trata-se de um fenômeno que só tem equivalentes em países como a China e a Índia.

Há tempos o mercado aguarda alguns movimentos que devem acelerar o ritmo de expansão do setor de seguros. A maioria deles parece depender exclusivamente do Governo Federal e do Poder Legislativo. Dentre os aguardados 'gatilhos' merecem destaque:
  • Privatização do IRB (Instituto de Resseguros do Brasil), que é aguardada há mais de uma década. Como nas últimas 3 eleições presidenciais, espera-se que o tema seja 'ressuscitado' logo no início do novo governo.
  • Seguro Rural ou Agrícola. Ele representa apenas 1% do PIB da agropecuária. Na Espanha, por exemplo, ele bate em 40%. Espera-se que depois dos imensos problemas enfrentados pelo agronegócio nos últimos 2 anos, o produto mereça atenção e incentivos por parte do Governo.
  • Redução da Carga Tributária, particularmente aquela que incide sobre os produtos Vida e Residência. Outro fator positivo é a possibilidade de inclusão dos Corretores de Seguros na modalidade conhecida como Simples.
  • Seguro Meio-Ambiente. Trata-se de um produto novo que pode fazer muito sentido em tempos de obras que ficam paralizadas por anos por questões ambientais.
  • Quebra do Monopólio do SAT (Seguro de Acidentes do Trabalho), que desde sempre é do INSS. É pouco provável que ocorra no curto ou médio prazos, mas trata-se, sem dúvida, de outro driver que pode favorecer o crescimento do mercado de seguros.
  • Flexibilização dos Produtos e das Formas de Contratação. São questões que dependem mais das próprias seguradoras e da SUSEP. A flexibilização forçará que as companhias de seguros sejam mais inovadoras e criativas.
Mas é claro que o mercado de seguros experimentará uma evolução ainda maior se o Brasil realizar a meta de crescimento de 5% do PIB nos próximos anos. Resumindo: raramente um setor da economia reúne tantas possibilidades de expansão. Não como uma 'bolha', um desvio, mas um crescimento sustentável, constante. No entanto, assim como o Brasil deve cuidar para que a sua infra-estrutura (de transportes e fornecimento de energia, por exemplo) não se torne um impedimento para o crescimento, todo o ecossistema que forma o setor de seguros deve fazer uma avaliação bem crítica dos processos, padrões e sistemas que o suporta.

Nosso próximo artigo pretende auxiliar a realização de tal avaliação.